AUDIBLE: Adan Rodriguez

Adan Rodriguez | Personal Trainer | 24 de março de 1986

Teve muito suor!

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A era off pads…

Primeiro, preciso falar sobre como eu entro no futebol americano. A história começa 12 atrás, lá pelo final de 2005, início de 2006. Foi mais ou menos nessa época que eu comecei a jogar futebol americano, ainda sem equipamentos – também conhecido como off pads. Eu treinava junto a um grupo de amigos meus, no Parque Barigui. Como neste parque de Curitiba existe o mito do jacaré que fica em um dos lagos, o nome do grupo era “Crocodiles”.

Usávamos uma chuteira básica, de soccer mesmo, uma bermuda, uma camiseta velha… e muito suor. A gente acabava se machucando muito, rasgava as camisetas, saía da grama completamente arranhado. Como não existia youtube não conseguíamos ver nada de drills ou técnicas. Tudo que aplicávamos, era o que víamos da NFL. Eu, por exemplo, copiava as movimentações dos receivers que eu via na televisão. Nesse período, aprendi muito com Dafines Mitchell, que me ensinou muita coisa que uso até hoje.

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Na época, meus amigos e família me viam como louco. “Como você está jogando futebol americano, sem equipamentos, no Brasil?”. Ninguém acreditava, nem que eu jogava, nem que isso daria certo por aqui. Mas, será que nós mesmos acreditávamos? Não tínhamos nenhuma pretensão de transformar o futebol americano em algo grande, isso não passava pela nossa cabeça. Até acreditávamos que iria funcionar, mas o foco era apenas em seguir praticando, nunca negando uma gota de suor.

Voltando aos equipamentos: o único que tínhamos era o protetor bucal, então pelo menos com dentista não precisaríamos gastar (rs). E, me lembro de uma história engraçada, e marcante, deste período: depois de algum tempo, um amigo meu trouxe uma luva dos Estados Unidos – mas ela era laranja. Infelizmente, essa era a cor que os nossos rivais (Brown Spiders) utilizavam, então passei um bom tempo pintando a luva de outra cor, o que foi bastante engraçado.

49aab286-fff2-4f40-9257-12369650abc9Falando em Brown Spiders…

Em 2007 o Brown Spiders se equipou, foram os primeiros do País. O Marcio Alves II e o Rodrigo Proença, alguns dos pioneiros da equipe, importaram os primeiros equipamentos. Logo após receberem o deles, eles nos procuraram pra fazer uma parceria, para que a gente também se equipasse. Afinal, em nada adiantaria apenas uma equipe preparada pra um jogo (risos). Nesse ponto, preciso ressaltar que eles foram muito parceiros. Conversamos bastante e chegamos a um acordo: o  Barigui Crocodiles também estava equipado!

Mas eu preciso falar: como esses equipamentos demoraram pra chegar. Eles vieram de navio, então demorou bastante! Estávamos todos muito ansiosos, empolgados mesmo, só pensávamos nisso. Eu lembro do momento que o meu chegou: quando peguei o equipamento pela primeira vez, fiquei praticamente o dia todo usando ele (juro!). Fiquei andando pra todo lado, vestindo o equipamento. Além disso, durante a semana eu fazia de tudo com o capacete. Até mesmo pra se acostumar com o peso, que era algo totalmente diferente. Mesmo quando eu estava no computador, estava de capacete.

E aí tem uma das partes mais bacanas – e fundamentais – para chegarmos à primeira partida full pads: a parceria entre o Croco e o Brown Spiders. Durante a adaptação aos equipamentos, fizemos vários scrimmages com o Brown Spiders. Foram vários treinos coletivos, pra que pudéssemos compartilhar o que tínhamos aprendido de técnica até então. Mesmo com a rivalidade que tínhamos, foi um trabalho coletivo de desenvolvimento técnico, entre todos os atletas, pra tornar possível o primeiro jogo full pads do Brasil.

25 de outubro de 2008 – A primeira partida full pads…

Que nostalgia gostosa me dá ao lembrar disso tudo!

Quando divulgamos que faríamos a primeira partida fullpads do Brasil, a imprensa veio em peso pra conversar com Croco e Brown Spiders. Lembro que combinávamos fotos no Parque Barigui pra fazer a divulgação do evento. Lembro também que fomos capa da Gazeta do Povo, um dos principais jornais do estado, e participamos de reportagens na televisão, tudo sobre a divulgação da partida.

Mas, um ponto básico dessa história toda ainda não estava definido: o local do jogo. Muito por conta do desconhecimento sobre o esporte, ninguém queria abrir as portas pra nós. Os donos dos campos falavam “como é isso, não vou alugar não”. Aí, depois de suar bastante, conseguimos conversar com o pessoal do Flamenguinho, no bairro São Braz, em Curitiba, que toparam a ideia. Curiosamente, essa foi a única partida de futebol americano que aquele estádio recebeu.

Não tínhamos nenhuma intenção de lucro. Queríamos apenas mostrar para o Brasil que era possível jogar futebol americano, exatamente da mesma fora que era jogado nos Estados Unidos. Tanto que o ingresso da partida era 1 kg de alimento não perecível.

WhatsApp Image 2017-10-30 at 11.27.04Já teve bastante suor (e dor de cabeça) até aqui né? Mas, como se não bastasse tudo isso, a próxima parte é um dos momentos que nós mais suamos (de verdade) nessa história toda: a pintura do gramado, um dia antes do jogo. Na verdade, o trabalho que as duas equipes fizeram pra tornar isso possível foi muito bacana. A parceria, mais uma vez, foi fundamental. Como pintar um gramado de futebol americano? Onde estão as medidas, como iríamos nos basear? Lembro que corremos atrás, pegamos as medidas e levamos a trena. Demoramos um dia inteiro, com as duas equipes lá, pintando errado, apagando e pintando de novo, sem nenhuma noção sobre quantas latas de tinta seriam necessárias para a pintura… era tudo muito novo, pra todo mundo! No fim das contas, o trabalho ficou bem bacana.

Como olhamos muito para o campo, não olhamos para a torcida. Na verdade, não tínhamos uma grande expectativa com relação ao público. Mas, no outro dia, quando chegamos para o jogo, meu amigo… tinha muita gente, mesmo. O pessoal estava em cima das árvores, dos muros, todo mundo com jacarés e aranhas de pelúcia – estava muito divertido. Nunca havia passado pela minha cabeça que aquele evento seria tão representativo para o Brasil.

Foram mais de três mil pessoas! Lembro perfeitamente que conseguimos arrecadar mais de três toneladas de alimentos. O ambiente estava surreal. Os atletas estavam muito nervosos. Todos tremiam, não sabíamos o que iria acontecer. Lembro que o vestiário era bem pequeno, então de vez em quando a gente saía pra dar uma olhada como estavam as coisas e víamos muita gente no alambrado, nos muros. Eram amigos, familiares, enfim… estava muito divertido!

f3ad3c1a-6b90-48b8-ba39-b29726111efdEu fecho o olho e lembro como se fosse hoje: lembro, perfeitamente, do momento que entrei em campo. Lembro do primeiro passe que eu recebi. Lembro do primeiro tackle que sofri. Comigo, no Croco, estavam o Lucas Mullet, o Bruno Santucci e o Kauã Pozzi, que seguem atuando. Pelo Brown Spiders, lembro que o Rômulo Tuleski e o Matheus Luz também estavam lá.

Era uma novidade da época, ver todo mundo equipado e uniformizado. Então, é muito bom ver que esse jogo fez muitos acreditarem que o futebol americano poderia dar certo no Brasil. Lembro que nas semanas que seguiram após o jogo a repercussão foi muito bacana. Demos entrevistas para jornais, para canais de televisão e mostramos para todo o país que o futebol americano no Brasil estava acontecendo. Aquele foi o primeiro grande passo dessa modalidade que hoje está voando por aí.

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Depois dessa partida…

Depois dessa partida, fizemos a primeira reunião sobre o campeonato brasileiro, que seria o Torneio Touchdown de 2009. Então, esse jogo, independente do resultado (que terminou em vitória do Brown Spiders), marcou muito a história do esporte.

Depois dessa partida, vimos times de outros locais se empolgando para se equipar, para tornar o primeiro campeonato também uma realidade. Então, hoje, olhando pra trás, eu tenho certeza que a gente estimulou várias equipes a fazerem esse esporte real no País. Também semanas após o jogo, surgiu o Pantanal Bowl, o primeiro full pads que o Croco viajou pra disputar, em Cuiabá. Na sequência surgiu também o primeiro campeonato paranaense, e aí a coisa começou a fluir.

E, logo depois da primeira partida full pads, tem uma história muito bacana, que eu vou contar numa outra hora: uma partida em Montevideu, no início de dezembro de 2008, contra o tetracampeão uruguaio. Apenas como aperitivo: foi uma viagem de 37 horas de ida e 35 de volta. No meio do caminho, estourou o pneu do ônibus e nós tivemos que desembolsar mais do que planejávamos, se é que vocês me entendem, pra liberar a entrada de alguns atletas no outro país, pois eles esqueceram os documentos. No fim das contas, tudo vale como experiência. A gente olha pra trás e dá muita risada de tudo isso.

Falando em olhar pra trás, hoje eu percebo que tudo valeu muito a pena. Todo o suor e a luta para fazer esse esporte acontecer, termos sido os pioneiros (o que nunca é fácil)… valeu a pena! Faltam palavras pra descrever o momento.

Aquele dia 25 de outubro foi mágico. Foi especial!

(Fotos: Cortesia / Arquivo pessoal Adan Rodriguez)

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